segunda-feira, 28 de junho de 2010

POUCAS & BOAS - Eduardo Kruschewsky

BAHÊA!

- Isto é uma merda! – resmungou – esse time não tem jeito! Como é que perde de 4 a 2 para o Vitória? E ainda mais sendo disputa do primeiro turno! Este meu Bahia é um timeco! Se ainda perdesse para o Fluminense de Feira, Catuense ou até mesmo o Atlético de Alagoinhas, ainda vai... Mas, pra esse Vitorinha!...
Camisa vermelha, azul e branca, radinho de pilha, cabeça grisalha, barriga proeminente, Guto saiu do Estádio da Fonte Nova, indignado. No rádio, Virgilio Elísio, tricolor e comentarista, tentava justificar a derrota, mas, no fundo, sabia que aquilo era “choro”, porque achava que o time jogara “pedra em santo”! Com Emerson contundido, Preto suspenso, Carlinhos gripado e Nonato fora de forma era como se o time tivesse quebrado a espinha dorsal. Perdendo conjunto, virava caixa de pancadas... Inconformado, foi, pelo caminho, ouvindo piadinhas dos torcedores do vencedor, seu maior rival. Pegou o ônibus e foi para casa, no subúrbio.
A mulher o esperava com um prato de sopa de abóbora fumegante, mas não quis jantar, comentando, com amargura, que já estava com a barriga cheia de tanto gol que o seu Bahia tomara. Tirou a camisa, tomou um banho, e sem desgrudar do radinho ligado sentou-se na varanda da casa. Ficou irritado, nervoso, quando o vizinho rubro negro abusado, de pura maldade, passou por sua porta com dois cascos de cerveja na mão e comentou, maliciosamente:
- E aí, Guto, gostou do “chocolate”?
- O quê? Mas, menino... Tá pensando o quê?Só porque ganhou uma? Mas... Mas... Tome jeito, seu merda! Não tá vendo logo? Seu time é o Vicetória. O meu é o Bahêa, meu chapa! O Bahêa!... O bom, o bicampeão brasileiro, meu!
- De quando? De mil novecentos e antigamente? Ora, Guto, quem vive de passado é museu! - e o provocador saiu dando risada, mostrando o escudo da camisa surrada para um Guto furioso.
Desligou o rádio quando ouviu, no placar nacional, que seu Vasco foi vencido por 2x1 pelo Criciúma e dentro de casa! “- E essa agora? Nem esta peste deste Vasco me dá alegria hoje?” A mulher chamou para assistir o “Fantástico”. Sentou-se no sofá para assistir a TV, mas decididamente aquele não era um bom domingo. Impacientou-se, voltou para a varanda e, à guiza de compensação, ficou recordando os velhos tempos, do Campo da Graça, do começo da Fonte Nova, quando os jogadores jogavam por amor à camisa, não tinham estes salários astronômicos! Velhos craques desfilaram por sua cabeça: Marito, Biriba, Rodolfo Rodrigues (goleraço, goleraço!), Roberto Rebouças (zagueiraço, o retrato do time do Bahia: raçudo, xerife, sabia impor respeito, “espanando” os atacantes adversários!), Washington Luiz, Edinho Jacaré, Beijoca, o próprio Bobô, estes, sim, eram jogadores, jogavam sério, honravam a camisa, não esses meninos de hoje que só pensam em dinheiro... E o timão da década de 50? Campeão brasileiro, sim senhor! Aquele é que era um Bahia! Até o Santos de Pelé, Pepe, Zito e companhia andou tomando cacete! Tudo isso sem falar nos meninos de 1988 que foram buscar o título em Porto Alegre, dentro do Beira Rio, arrancando o empate do Internacional! Qualquer comparação que fizesse com o time atual era absurda! “ Hoje, o time só tem “perna de pau!” e mercenário! “- falou alto sem querer e ouviu do outro lado do muro:
“-Também quem manda torcer pra timinho? Tu vai é prá segunda divisão, cabra!”- vaticinou, num frouxo de riso, o vizinho, torcedor do Vitória. Achou melhor não responder à provocação e ficou ali, sozinho, entregue às lembranças. Num cúmulo de provocação, o miserável do rubro-negro passou a ouvir, às alturas, o hino do rival. Ele, que não era de confusão, engoliu o desaforo e recolheu-se.
No domingo seguinte, esquecido da amargura da semana anterior, camisa tricolorida, radinho de pilha, Guto pegou o ônibus e foi para a Fonte Nova assistir Bahia e Corinthians pelo Campeonato Nacional. No ônibus lotado, ia alegre, feliz e cheio de esperanças. Quase que aos brados, falava, entusiasmado, com um cidadão que estava ao seu lado. O outro fingia estar compreendendo aquelas coisas de esporte, dando ouvidos por uma questão de educação porque, na verdade, detestava futebol. Guto, eufórico, não se dava conta e bradava, batendo nas costas de um incomodado cidadão que ria, sem graça:
“-Meu chapa, nesse jogão de bola não tem pra ninguém porque o meu Bahêêa, o melhor time do Brasil,vai enfiar 3 no “coringão”!!... Bahêêêêê...a!!!”

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